Estado de Minas CIÊNCIA

Vírus do HPV acompanha a humanidade há centenas de milhares de anos

Estudo descobriu que variantes do HPV saíram da África e se espalharam para outros humanos primitivos


postado em 30/11/2017 11:10 / atualizado em 30/11/2017 11:10

(foto: Pixabay)
(foto: Pixabay)
Num momento em que as discussões acerca dos benefícios da vacina contra o Papilomavírus Humano (HPV) ganham cada vez mais força, vale a pena conhecer um pouco das origens desse micro-organismo, que faz parte da "vida" da humanidade há milênios. Responsável por causar câncer de colo de útero e cervical, o vírus HPV pode ter causado suas primeiras infecções há mais de 200 mil anos, segundo um estudo realziado no Instituto Catalão de Oncologia, em Barcelona, na Espanha. As infecções atingiram indivíduos do gênero humano pertencentes à espécie ancestral comum do homem moderno, dos neandertais da Europa e dos denisovanos da Ásia.

A família do papilomavírus compreende mais de 200 tipos de vírus, que se encontram espalhados pelo mundo. Todo ser humano sofre, em algum momento da vida, pelo menos uma infecção causada por algum tipo de vírus HPV. Em sua imensa maioria, os casos são assintomáticos.

A doença afeta preferencialmente a região anogenital e a pele. Mais de 40 tipos de HPV são transmitidos por meio da relação sexual. Boa parte deles é inofensiva. Alguns tipos podem ou não formar verrugas benignas e outros são malignos e podem até levar ao surgimento de lesões cancerígenas.

Dois vírus HPV, os tipos 16 e 18, são responsáveis pela quase totalidade dos casos de câncer cervical. De acordo com o Relatório Mundial do Câncer, de 2014, o tumor cervical é o quarto tipo mais comum de câncer entre as mulheres e também a quarta causa mais comum de morte por esse tipo de doença entre o público feminino.

O tipo 16 do vírus responde por 50% de todos os casos de câncer de colo de útero. À medida que estudos desse tipo de tumor avançaram nas últimas décadas, um padrão curioso começou a emergir. Percebeu-se que a incidência das variantes e sublinhagens do HPV 16 variava de acordo com a região do mundo. Infecções causadas por algumas variantes são predominantes nas Américas, na Europa, no Oriente Médio e no subcontinente indiano, enquanto outras prevalecem no norte da África, outras ainda se sobressaem na África subsaariana ou no leste e sudeste da Ásia.

Mais além, sabe-se que o potencial cancerígeno não é o mesmo para todas as variantes do HPV 16 e varia em associação com diferentes populações humanas. À primeira vista, a distribuição geográfica das variantes sugeria uma possível conexão com a distribuição histórica das principais etnias humanas: caucasianos, negroides e mongoloides.

"A predominância geográfica das diversas variantes de HPV 16 parecia, em princípio, estar ligada à etnia do paciente", comenta a bioquímica brasileira Cristina Mendes de Oliveira, do Hospital do Câncer de Barretos, uma das autoras do estudo feito an Espanha.

"Imigração" do vírus

Entre 120 mil e 60 mil anos atrás, quando os primeiros humanos modernos começaram a sair da África para povoar os quatro cantos da Terra, levaram consigo a variante B do HPV 16, que surgiu há cerca de 200 mil anos.

Quando os descendentes dessas levas migratórias entraram em contato com as outras espécies humanas preestabelecidas fora da África, os neandertais na Europa e os denisovanos na Ásia, a variante A de neandertais e denisovanos infectou os humanos modernos não africanos, praticamente tomando o lugar que era da antiga variante B.

Enquanto isso, no estoque humano que permaneceu na África, novas divergências nos últimos 100 mil anos fizeram surgir as variantes C e D. Da mesma forma, por meio da expansão da Eurásia, os humanos modernos que carregavam a variante A acabaram gerando sublinhagens.

"É a primeira vez que se obtêm estes resultados. Com base nessas informações, talvez no futuro seja possível avançar no diagnóstico dos casos de câncer cervical. A ideia é um dia poder avaliar o potencial carcinogênico do HPV 16 em função das diversas etnias", comenta Cristina Oliveira.

(com Agência Fapesp e Jornal da USP)

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