Para Lucas Alvares, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e um dos autores do estudo, a intenção foi descobrir os mecanismos moleculares que estão por trás da formação da memória e como ela pode ser esquecida ou modificada. "Uma das nossas linhas de pesquisa é como mudar uma memória traumática em alguém que sofre com o transtorno pós-traumático", comenta o cientista em entrevista para o jornal Correio Braziliense.
O interesse pela cafeína surgiu de estudos anteriores que mostram as qualidades do composto para a saúde, além da experiência pessoal com a bebida. "Eu sou um grande admirador do café, me sinto bastante bem com o efeito da cafeína. E, olhando para a literatura , vimos que ela tem um efeito farmacológico em potencial para 'atualizar' uma memória afetiva", diz Alvares.
O cientista, juntamente com sua equipe, provocaram traumas em roedores para criar memórias negativas, como as que ocorrem nesse transtorno.
Para a equipe, a cafeína "desarma" as memórias traumáticas, processo necessário para que possam ser alteradas. "Hoje, sabemos que a memória é mais dinâmica do que se pensava anteriormente. Podemos alterar o seu conteúdo, assim que ela é formada. Ela é fortalecida pelas sinapses, porém, o ato de lembrar faz com que fique vulnerável e possa ser alterada", explica o cientista ao Correio.
Ainda de acordo com Lucas Alvares, esse mecanismo se chama reconsolidação da memória, fenômeno pelo qual as lembranças podem ser modificadas permanentemente pela via da reativação. O pesquisador ilustra como a cafeína entraria nesse processo: "Ela poderia ser usada em uma sessão de terapia, como uma ajuda no processo de modificar a memória".
A quantidade de cafeína usada nos experimentos variou conforme o tipo de trauma. "Vimos que, quando a memória não era muito aversiva, uma só dose foi suficiente, mas, para memórias antigas, que seriam mais similares às do transtorno pós-traumático, foi necessário aplicá-la três vezes", detalha o professor da UFRGS.
Felizes com os resultados, os investigadores darão continuidade à pesquisa. O próximo passo será entender melhor os efeitos, no cérebro, dos receptores da adenosina, que são afetados pela cafeína..