Um estudo realizado por cientistas da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e da University of Sussex, da Inglaterra, verificou que as abelhas jataí (Tetragonisca angustula) apresentam uma estratégia de defesa de seus ninhos diferente da observada em outras espécies de insetos sociais. Além de guardas posicionadas na entrada, as colônias dessa espécie também contam com abelhas guardiãs, pairadas próximas à abertura do ninho.
Há uma forte tendência dessas guardas em voo pairado se distribuírem em números iguais, em ambos os lados da entrada do ninho. Dessa forma, essas abelhas "drones" conseguem detectar e interceptar mais rapidamente intrusos que se aproximam da colmeia antes de chegarem à entrada e iniciarem um ataque. Com isso, as jataís conseguem aumentar e melhorar a vigilância de suas colônias, constataram os pesquisadores.
O estudo foi publicado na revista científica Behavioral Ecology. "Observamos que as guardas de jataí coordenam a estratégia de vigilância de seus ninhos contra abelhas ladras e possíveis predadores", comenta a pesquisadora Denise de Araujo Alves, da USP, uma das autoras do estudo, em entrevista à Agência Fapesp.
Os cientistas filmaram e analisaram 15 colônias de abelhas jataí, que são consideradas levemente agressivas, mas suas guardas são especialmente defensivas em relação à abelha-limão (Lestrimelitta limao). Essa outra espécie, que também não tem ferrão, é a principal ladra dos ninhos de jataí e seus ataques podem ser muito perigosos.
Foram contadas as abelhas guardas que estavam pairadas na entrada de cada colônia e registrado o número das posicionadas à esquerda e à direita. Os resultados apontam que as defensoras em voo pairado na entrada dos ninhos estavam distribuídas mais uniformemente em ambos os lados da entrada dos ninhos do que seria esperado se cada uma estivesse posicionada aleatoriamente.
As medidas do ângulo de cada abelha guarda em voo pairado em relação à entrada de seu ninho, feitas a partir da filmagem das colônias, também revelaram que a coordenação das guardas pairando em proporção uniforme aumentou a vigilância coletiva do grupo. Isso porque essa organização de posicionamento possibilita às abelhas guardas terem um campo visual coletivo maior.
"Os benefícios da vigilância coordenada em relação ao tamanho do grupo ainda são desconhecidos.
Comportamento altruísta
Segundo os autores, os resultados do estudo permitem compreender melhor como os insetos sociais coordenam sua vigilância contra predadores e cleptoparasitas (abelhas-limão).
A maioria dos trabalhos anteriores investigou o efeito do tamanho do grupo no nível de vigilância dos insetos sociais contra predadores, a partir do pressuposto de que o nível de vigilância desses animais diminuiria à medida que o tamanho do grupo aumenta – uma vez que os membros do grupo dedicariam menos tempo sendo vigilantes. Mas como um vigilante se posiciona em relação a outro vigilante no grupo e como isso afeta a vigilância coletiva tem recebido menos atenção do que o efeito do tamanho do grupo.
"Há relativamente pouca pesquisa para avaliar se o nível de vigilância coletiva de um grupo de insetos sociais aumenta se o grupo coordenasse seus esforços de vigilância, tais como monitorar direções diferentes, como constatamos agora nesse estudo com as abelhas jataí", afirma a pesquisadora da USP.
A vigilância dos insetos sociais difere da maioria dos vertebrados que vivem em grupos. Diferentemente de grupos de peixes, aves ou mamíferos, que podem fugir de seus predadores, os insetos sociais têm que proteger seus ninhos, pois neles estão os indivíduos reprodutivos, as crias e seu estoque de alimentos. Dessa forma, a detecção precoce de predadores é importante para os insetos sociais porque os primeiros predadores a chegar são frequentemente outras espécies de insetos sociais que, muitas vezes, podem recrutar companheiras para um ataque em massa.
"Em contraste com indivíduos em um rebanho ou cardume, por exemplo, que muitas vezes não são relacionados geneticamente, as guardas de insetos sociais devem estar sempre atentas. Como a sobrevivência delas está mais atrelada à colônia do que à sua segurança pessoal, o altruísmo dos insetos sociais provavelmente ‘facilitou’ a evolução da vigilância coordenada de seus ninhos", compara Denise Alves.
(com Jornal da USP).