Pesquisadores do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG identificaram um mecanismo no cérebro responsável por controlar os efeitos da cocaína, uma das drogas que mais causam dependência. Esse processo, cujo funcionamento ainda não é conhecido, mostrou-se capaz de apagar a memória do consumo do entorpecente em animais de laboratório. Os resultados da pesquisa foram publicados no periódico científico British Journal of Pharmacology em agosto deste ano.
"O cérebro de um usuário de drogas guarda as memórias relacionadas ao uso. Por exemplo, mesmo depois que um alcoolista deixa de beber, passar em frente a um bar reacende o desejo pela bebida. O que constatamos é que, ao agir sobre uma parte do neurônio que não é aquela sensível às substâncias que causam os efeitos negativos das drogas, anulamos a memória do uso", afirma o professor Fabricio Moreira, do Laboratório de Neuropsicofarmacologia da UFMG, em entrevista para o jornal Boletim da universidade.
De acordo com o pesquisador, a cocaína age sobre o mesmo sistema neural afetado pela maconha. E os neurônios produzem substâncias semelhantes ao tetraidrocanabinol (THC, princípio ativo da Cannabis sativa). São os chamados endocanabinoides, muito importantes para modular desejo e motivação e que são liberados antes das ações que geram satisfação, como comer e usar drogas. "Medicamentos que impedem a ação dos endocanabinoides já foram utilizados, por exemplo, contra a obesidade, uma vez que reduzem a vontade de comer. Mas acabaram banidos devido a seus efeitos adversos", comenta o professor.
Teste
Os cientistas da UFMG injetavam cocaína nas cobaias, que ficavam num lado específico da caixa de contenção, seguindo os padrões de equivalência de efeitos em humanos. No dia seguinte, os mesmos animais não recebiam a droga e, ao serem levados à caixa, procuravam o lado em que estavam no dia anterior. "Passamos, então, a administrar substâncias sintéticas, produzidas especificamente para testes nos receptores neuronais, e essa ação apagou a memória da droga nos animais", conta Fabricio Moreira.
Os próximos passos, conforme o professor, incluem investigar o interior da célula neural, com a participação de outros laboratórios. "Queremos descobrir que proteínas são modificadas. Também é preciso saber se o que observamos sobre a cocaína se aplica a outras drogas, como a nicotina e o álcool", afirma Moreira.
(com Boletim da UFMG)