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Primeiro foi a vez da gordura do leite, na época em que gorduras estavam sendo apontadas como vilãs e principal motivo para aumento da obesidade, infarto e outras condições. Foi quando se passou a indicar o consumo de leites e iogurtes desnatados ou semidesnatados - ou seja, com redução do teor de gordura -, que mantinham as propriedades positivas do alimento sem prejudicar o corpo. Em seguida, foi a vez da lactose, açúcar do leite que algumas pessoas vão perdendo a capacidade de digerir ao longo dos anos. A intolerância a esse açúcar se tornou outro motivo para os lácteos serem questionados, e uma profusão de produtos sem lactose tomou conta das prateleiras de supermercados. Tudo na intenção de se garantir a ingestão de laticínios aos consumidores, apesar das indagações.
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A necessidade de cálcio é um dos principais motivos pelos quais os defensores do leite indicam seu consumo. Entre outras propriedades, o mineral é um dos componentes que garantem a saúde dos ossos e previnem a osteoporose. "Os lácteos são os principais produtos que temos hoje para fornecer a quantidade ideal de cálcio", explica Márcio Lauria, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - regional Minas. Para se ter ideia, a recomendação de ingestão diária de cálcio para adultos entre 19 e 50 anos é de 1000 mg [a título de comparação, um copo de leite possui cerca 244 mg]. De acordo com o endocrinologista, alguns produtos de origem vegetal também contêm grande quantidade do mineral, como as verduras verde-escuras. No entanto, a biodisponibilidade dos lácteos, ou seja, sua eficácia de absorção, é maior do que a de outras fontes de cálcio. "Então a quantidade de alimento a ser ingerida para se obter a mesma quantidade do elemento teria de ser muito grande", afirma.
Correntes contrárias ao consumo do leite questionam a relevância dos lácteos para o controle da osteoporose, citando o "paradoxo do cálcio": o fato de países entre os maiores consumidores de laticínios também estarem entre os que mais têm casos da doença. A OMS reconhece o paradoxo, mas sugere cautela ao invocá-lo. Também é como se posiciona a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. "A questão é baseada em estudos observacionais, então é preciso cuidado na interpretação. A observação poderia ser também de que o caso seria pior se não houvesse a ingestão de cálcio nesses povos", afirma o endocrinologista. "É como dizer que caminhar engorda, pois alguém observou que há muitas pessoas acima do peso caminhando. Desconheço estudos que tenham demonstrado o paradoxo pelo método da intervenção, e não da observação."
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Penchel explica que a caseína, uma das proteínas do leite, é altamente inflamatória para o corpo humano. "O nosso corpo não está preparado para absorver todos os elementos do leite de vaca. O leite materno, para o qual estamos adaptados, não contém os mesmos elementos, nem na mesma quantidade. Além disso, o leite tem inúmeros aditivos para manter a validade alta, a conservação etc.", diz.
O nutrólogo afirma que já há vários estudos científicos que indicam malefícios do consumo de leite, mas que esse hábito é tão institucionalizado - "tem apoio do governo, pressão das indústrias" - que é difícil mudar a mentalidade e retirar o produto da rotina alimentar, mesmo sendo possível substituir seus nutrientes por outras fontes. "De fato, ainda não é consenso na comunidade científica, mas toda teoria passa por três etapas: primeiro, é ridicularizada, depois, contestada e, por fim, aceita", diz. E completa afirmando que essa teoria estaria na segunda etapa, senão, não haveria estudos sendo feitos a respeito ou tantos eventos realizados para divulgar posições a favor e contra seu consumo.