Uma equipe de cientistas do Centro Alemão de Pesquisa do Câncer (DKFZ), em Heidelberg, liderada pelo pesquisador Harald zur Hausen, vencedor do Nobel de Medicina em 2008, aponta uma relação entre o consumo de laticínios e de carne vermelha a uma infecção que, com o passar dos anos, aumenta o risco de aparecimento de câncer de intestino e de mama, assim como de esclerose múltipla. A informação foi divulgada pela emissora estatal alemã Deutsche Welle.
Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores identificaram no tecido intestinal quais áreas são afetadas por supostos agentes infecciosos de origem bovina. Além disso, foram realizadas análises comparativas mundiais para saber onde pode haver uma relação entre a taxa de incidência de câncer de intestino e de mama e o consumo de produtos lácteos e de carne de boi. Eles perceberam que em regiões do mundo onde há um alto consumo desses alimentos também há uma elevada incidência desses tumores, como na América do Norte, na Argentina, na Europa e na Austrália. Nessas regiões são consumidos sobretudo produtos de gado europeu (Bos taurus).
Já na Índia, a incidência de câncer de intestino e de mama é baixa, talvez porque as vacas são consideradas animais sagrados pelos hindus e não são consumidas. Os cientistas do DKFZ perceberam que nos estados indianos que possuem vacas leiteiras como apoio à alimentação infantil, as taxas de incidência de tumor de mama são maiores.
Curiosamente, na Bolívia e na Mongólia foram encontradas baixas taxas de câncer de intestino e de mama, embora as pessoas comam muita carne bovina – só que de outro tipo de gado. Na Bolívia, a criação de zebu (Bos indicus, original da Índia) é preferida. A situação é semelhante na Mongólia, onde o gado também procede principalmente de cruzamentos com zebus importados.
No Japão, a taxa de câncer de intestino, que era extremamente baixa, começou a aumentar cerca de 20 anos após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), e na Coreia do Sul, apenas 20 anos após a Guerra da Coreia (1950-1953). Neste dois países, o aumento ocorreu paralelamente ao crescimento da importação e do consumo de carne.
Como mostra a Deutsche Welle, a hipótese inicial da equipe liderada por Harald zur Hausen era de que um vírus seria o agente infeccioso e, por isso, eles usaram técnicas para isolar o suposto vírus. No entanto, o que encontraram foram elementos de DNA circulares e de cadeia simples que têm grande semelhança com sequências de determinados plasmídeos bacterianos. Eles foram chamados de Bovine Meat and Milk Factors (BMMF, ou Fatores de Leite e Carne de Boi, em tradução livre).
As infecções são localizadas no intestino grosso, na camada de tecido conjuntivo localizada sob a mucosa intestinal, sobretudo nas proximidades das chamadas criptas intestinais – depressões tubulares da mucosa que servem para a secreção de enzimas e em cuja extremidade inferior estão localizadas as células-tronco intestinais.
Como o sistema imunológico humano só está formado totalmente após cerca de um ano de vida, os pesquisadores do Centro Alemão de Pesquisa do Câncer suspeitam que os bebês sejam infectados precocemente quando recebem alimentação com produtos de origem bovina. Os agentes infecciosos induzem uma reação inflamatória crônica em determinados tecidos, como no intestino ou na mama, que pode promover a formação de câncer no tecido circundante. Porém, a doença só se manifesta décadas após a ingestão inicial de carne ou leite.
Os cientistas lembram que a amamentação prolongada (além de 6 meses de idade) pode proteger os bebês da infecção por uma série de patógenos (norovírus e rotavírus, por exemplo), incluindo os agentes presentes nos laticínios e na carne de boi. O aleitamento prolongado também pode proteger as próprias mães da infecção com os patógenos bovinos, segundo os pesquisadores alemães.
De qualquer forma, a equipe o DKFZ adverte que a infecção com os agentes do leite e da carne não leva necessariamente ao câncer de intestino e de mama no futuro. Agora, conforme a emissora estatal alemã, os cientistas estão realizando novas pesquisas para saber se há uma relação entre a quantidade de agentes infecciosos presentes em pacientes com câncer de intestino e a sobrevivência dos indivíduos infectados.
(com Deutsche Welle)
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