Revista Encontro

Representatividade

Ainda são poucos os candidatos negros no Brasil

Eleições 2018 mantêm a baixa representatividade dos afrodescendentes

Encontro Digital
- Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil/Divulgação

Assim como ocorre com as mulheres, a baixa representatividade dos negros no legislativo e no executivo do Brasil deve se manter nas Eleições 2018. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pretos e pardos correspondem a 54,9% da população brasileira, mas são apenas 46,5% (35,7% pardos e 10,8% negros) dos cerca de 29 mil candidatos aos oito cargos que estarão em disputa no dia 7 de outubro.

Ao todo, são pouco mais de 13 mil candidatos negros: a maior parte deles (66% pardos e 61,9% pretos) disputa vagas nas assembleias legislativas, enquanto apenas cerca de 3% decidiram disputar cargos majoritários de presidente (0,07%), governador (1,1%) e senador (1,9%). Por outro lado, o número total de candidatos negros subiu 2% neste ano em relação às eleições de 2014 (44,2%).

Carmela Zigoni, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), aponta outro avanço: o número de candidatas que se autodeclararam pretas ou pardas cresceu 70%. "No entanto, ainda temos um quadro bem complicado de sub-representação. A maioria das mulheres negras concorre ao cargo de deputado estadual", comenta a especialista.

A Câmara dos Deputados também espelha essa sub-representação e tende a mantê-la, mesmo depois de 190 anos da eleição do primeiro parlamentar afrodescendente. Em um Brasil ainda imperial e escravocrata, o baiano Antônio Pereira Rebouças, filho de pai português e mãe escrava liberta, foi eleito em 1828 para a segunda legislatura da Câmara (1830/1833). Já o Brasil republicano assistiu, em 1909, a eleição do pernambucano Manoel da Motta Moreira Lopes, primeiro deputado federal filho de pai e mãe negros e conduzido ao parlamento pela mobilização dos próprios negros.

Em 2014, apenas 103 (20%) dos 513 deputados federais eleitos se autodeclararam pretos ou pardos. Nas eleições deste ano, os negros (30,8% pardos e 10,9% pretos) correspondem a 41,7% do total dos mais de 8,5 mil candidatos à Câmara dos Deputados.
O percentual é praticamente o mesmo de quatro anos atrás (41%), embora os números absolutos mostrem cerca de 600 candidatos negros a mais na disputa para deputado federal.

Falta de apoio

A cientista política Nailah Veleci avalia que o aumento de candidaturas é "muito tímido" para determinar maior número de deputados negros efetivamente eleitos. Ela lamenta não haver candidaturas independentes e diz que, no atual sistema eleitoral, "não votamos exatamente naqueles que querem se candidatar, mas sim naqueles que os partidos escolhem para dizer que podem nos representar".

Veleci acredita que os partidos têm muitos candidatos negros porque querem mostrar diversidade, "mas investem realmente nas candidaturas brancas já conhecidas", afirma a especialista. Ainda segundo ela, baixo poder econômico e preconceitos reforçados pela mídia são alguns dos fatores que prejudicam o chamado "capital político" dos candidatos negros ao parlamento.

Segundo Carmela Zigoni, mesmo com o fundo público de financiamento, essas candidaturas têm menos apoio e menos conhecidas da sociedade. "Com isso, a gente continua reproduzindo privilégios dentro do processo eleitoral brasileiro", afirma a assessora do Inesc.

Possíveis soluções

Entre as possíveis soluções, a cientista política admite cotas para candidatos negros, desde que associadas a um sistema de lista fechada que impeça o lançamento das chamadas candidaturas "laranjas", usadas apenas para preencher requisitos legais, mas sem viabilidade eleitoral.

Carmela Zigoni, que também é doutora em Antropologia, acredita que as cotas devem ser acompanhadas de outras ações, como uma definição mais nítida da partilha do fundo de financiamento das candidaturas – para mulheres, negros e indígenas também.

"Entre uma eleição e outra, deve haver processos de formação e educação para que a sociedade tenha consciência da necessidade de maior representatividade nos espaços de poder. Porque, na medida em que a nossa sociedade tem um racismo estruturante, assim como o machismo muito presente também, na hora do voto, as pessoas acabam optando por aquele perfil que sempre esteve ali ou optando por não votar", comenta Zigoni.

(com Agência Câmara Notícias).