Estado de Minas ESPECIAL NOVO CORONAVÍRUS

Trabalhar a partir de qualquer lugar é tendência

Especialistas garantem que, no futuro, funcionários devem produzir tanto em home office, como no escritório e em espaços de coworking


postado em 19/06/2020 15:55 / atualizado em 22/06/2020 13:35


A mineira Roberta Vasconcellos, CEO da startup BeerOrCoffee, especializada em conectar empresas e profissionais liberais a centenas de coworkings Brasil afora, descumpriu suas próprias regras quando o assunto é home office. Pega de surpresa pela política de isolamento social imposta para conter a disseminação do novo coronavírus - como quase todos nós, na verdade - se viu trabalhando 16 horas por dia."Era contra tudo o que eu acreditava e precisei dar um passo atrás", conta. "Estar conectado demais, ocupado demais, não significa produzir mais. Muitas vezes o que acontece é o contrário." Ela precisou estruturar sua rotina para produzir de maneira satisfatória mesmo em meio à quarentena. Como todos deveriam fazer, aliás. "O interessante é que a pandemia acabou antecipando o futuro do trabalho em 10 anos", acredita. Para ela, quando for possível retornar com segurança aos escritórios, as companhias dos mais diversos portes devem investir no que chama de anywhere office(ou escritório em qualquer lugar, em tradução livre). Os colaboradores poderão trabalhar um dia em casa, outro na empresa e outro ainda em um coworking perto de onde têm uma reunião, por exemplo, evitando o uso de transporte sem necessidade - o que trará benefícios às cidades como menos trânsito e poluição. "As sedes das empresas precisarão mudar por causa da política de segurança implantadas para os próprios colaboradores e abrigarão menos gente."

Para o headhunter David Braga, da Prime Talent, sai a fiscalização e entra a performance:
Para o headhunter David Braga, da Prime Talent, sai a fiscalização e entra a performance: "Os líderes foram habituados a terem poder e controle sobre o que os liderados estão fazendo a todo momento. Com o home office, isso fica mais difícil" (foto: Violeta Andrada/Encontro)
Há estudos que colocam em números o aumento de produtividade de quem trabalha em casa. Uma pesquisa da Universidade de Stanford mostrou que o home office aumenta em 13% a produtividade, seja porque a pessoa não perde tempo no trânsito ou em um almoço mais demorado com um colega ou porque o ambiente é mais propício para a concentração. Mas é claro que o escritório não deve ser abandonado por causa disso. "Somos seres sociáveis e vamos sentir falta de encontrar pessoas, mudar de ambiente...", diz Roberta. Por isso a importância de um modelo híbrido. Em um futuro próximo, em maior ou menor escala, toda empresa irá avaliar se é a hora de aderir ao home office - ou ao anywhere office, como gosta de dizer Roberta. O banco BMG, por exemplo, deixou, em meio à quarentena, 96% de seus funcionários em teletrabalho. Assim que for possível a volta, estuda fazer um rodízio entre os colaboradores para que, todos os dias, cerca de 30% deles trabalhe de casa. "Os resultados foram muito positivos, tanto para a empresa quanto para os funcionários", afirma o presidente do conselho do banco, Ricardo Guimarães.

Segundo o headhunter David Braga, CEO da Prime Talent, empresa de busca e seleção de executivos de média e alta gestão, essa mudança pode causar também uma transformação na cultura das empresas. "Os líderes foram habituados a terem poder e controle sobre o que os liderados estão fazendo a todo momento", diz. "Com o home office, isso fica mais difícil." Sai a fiscalizaçãoe entra a performance. Essa nova cultura exige novas habilidades, tanto dos líderes quanto dos liderados. Dos gestores, serão demandadas capacidades de criar confiança e persuadir seus comandados, mesmo sem o tête-à-tête diário. Já os colaboradores terão de lidar com gestão do tempo e resiliência. "As empresas precisarão confiar muito mais em seus profissionais e para isso talvez devem investir em um pessoal mais sênior, capaz de melhores entregas", afirma David, que também acredita que o sistema de sucesso seja híbrido. "O escritório não vai acabar, mas não será mais como antes."

Uma das queixas de quem se viu obrigado a trabalhar de casa foi em relação à tecnologia. Reclamações de sinal de internet falho foram constantes e as operadores chegaram a estimar uma diminuição na qualidade dos canais de streaming para que a rede não ficasse sobrecarregada. Com relação a isso, a implantação da tecnologia 5G, prevista para chegar ao país no próximo ano, pode dar ainda mais impulso ao trabalho remoto. "Será possível criar soluções inéditas e que podem contribuir para a retomada da economia no pós-pandemia, principalmente em um país com as dimensões continentais do Brasil", afirma Homero Salum, gerente de engenharia da operadora Tim. Além da velocidade de download aumentar consideravelmente, haverá ganhos com economia de bateria e cobertura, já que a infraestrutura 5G permite que mais aparelhos permaneçam conectados ao mesmo tempo em uma mesma área. É certo que as estruturas ultrapassadas estão com os dias contados. O headhunter David Braga recorre à MPB para descrever esse momento auspicioso. "É como aquela música do Lulu Santos: 'Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia'", diz. E quem não se adaptar ficará para trás, sejam empresas sejam profissionais.

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