Manter a esperança em tempos tão difíceis pode ser desafiador, e muitas pessoas que tinham por hábito frequentar a igreja e, assim, renovar a fé em dias melhores, se viram sem poder entrar no espaço que lhes acolhia tão bem. Apesar de não ter tido proibição de funcionamento, por parte do município, em nenhuma etapa das medidas contra a Covid-19, igrejas católicas e evangélicas fecharam suas portas para celebrações pelos primeiros meses, para avaliar como poderiam funcionar em novos tempos e também para contribuir com a diminuição de aglomerações. Durante esse tempo, fiéis puderam acompanhar missas, cultos e celebrações de forma remota. Para alguns, no entanto, a alternativa não é a mesma coisa que estar presencialmente na igreja do coração. Sendo assim, aos poucos, entidades religiosas foram se organizando e propondo maneiras de receber o público de forma presencial. Em comum, medidas de redução da capacidade do espaço, distanciamento entre os presentes (com demarcação de cadeiras ou bancos que podem ser usados, quando for o caso), uso de máscaras, álcool gel e tapetes sanitizantes, além de suspensão ou adaptação de rituais que envolvam contato físico, bem como horários reduzidos.
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As igrejas evangélicas começaram o processo de reabertura antes das católicas. Na Igreja Batista Central, por exemplo, cultos foram retomados em 31 de maio, seguindo as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), Ministério da Saúde e Secretaria Municipal da Saúde para esse tipo de evento, repassadas aos representantes religiosos da cidade. O templo do bairro Luxemburgo, que tem capacidade para 3.200 pessoas, pode realizar cultos com até 600. O primeiro evento foi feito com 150, como maneira de testar a dinâmica. Para participar, os fiéis (exceto crianças ou pessoas acima de 60 anos, que ainda não podem participar) devem se inscrever em um site de ingressos online. A liberação é por ordem de chegada. A orientação é que cheguem 20 minutos antes, para higienização, e evitem aglomerações na saída. Há pessoas dentro da igreja designadas para orientar os fiéis, caso não estejam cumprindo alguma das normas combinadas. "Nem deixamos as pessoas usarem os estacionamentos, para diminuir a chance de proximidade", explica Luiz de Jesus, um dos pastores da Central. "Melhor errar pelo excesso do que pela falta."
O teste deu certo, e as celebrações seguintes foram aumentando o número de pessoas gradualmente. Ainda assim, todos precisam se acostumar ao tal "novo normal". "Ficamos muito tempo fazendo apenas online, então foi ótimo ver as pessoas lá, ainda que todas de máscara, sem o contato que é tão característico nosso", afirma pastor Luiz. "Mas é uma realidade com a qual a gente talvez tenha de viver por muito tempo", completa. Para pessoas de grupos de risco ou que ainda não se sentem seguras para retornar, os cultos online ainda são realizados. Outra mudança importante foi no que diz respeito às chamadas células. Os grupos menores, que se encontravam com regularidade nas casas dos fieis para estudo da Bíblia e oração, também passaram para formato remoto. "Nós já tínhamos presença grande nas casas das pessoas, com as reuniões menores. O que fizemos foi passá-la para os aplicativos", explica Luiz. Pesa muito a perda do contato físico, presença dos amigos - e até dos lanchinhos -, mas ganha-se em outros aspectos, pois nesse formato é possível participar até de outros países.
Para as igrejas católicas, o processo começou mais tarde, após divulgação, pela Arquidiocese de BH, do documento "Evangelização missionária: um novo tempo". O protocolo, elaborado com apoio de um comitê técnico, contém as orientações para celebrações presenciais nas paróquias da capital e de 27 municípios da região metropolitana. As orientações incluem organização da entrada e saída após as celebrações, distanciamento de 2 metros entre as pessoas, proibição do uso de ar condicionado, controle do número de pessoas em cada evento, obrigação de uso de máscara por todos os fiéis, desinfecção dos espaços, não disponibilização de água benta na entrada da igreja e dispensa de folhetos litúrgicos, entre outras medidas. O Rito da Paz (em que se toca em outras pessoas) deve ser feito sem contato físico ou deslocamento e a hóstia entregue à mão, e não diretamente na boca.
O texto foi lançado em 17 de junho, cerca de três meses após o início das medidas da prefeitura contra a Covid-19 em BH. Algumas igrejas retomaram celebrações com público logo em seguida, outras estavam se preparando para reabrir até o fechamento desta edição e, ainda, algumas paróquias chegaram a receber fiéis para celebrações, mas decidiram voltar atrás e manter apenas as missas online, devido à decisão do prefeito Alexandre Kalil de voltar à fase zero da reabertura em 29 de junho.
Na paróquia Sagrada Família, celebrações foram retomadas no fim de semana seguinte à publicação do documento da Arquidiocese, após readequação do espaço e adaptações necessárias. Com capacidade para 500 pessoas sentadas, a igreja recebe hoje até 100 pessoas, com distribuição de senha no caso dos eventos de fim de semana e espaçamento de 2 metros entre os fiéis no interior. Segundo o pároco, padre José Januário Moreira, não chegaram ainda, em nenhuma celebração, até o máximo de pessoas, justamente porque não devem ir idosos, crianças ou pessoas de grupos de risco. Contudo, ressalta a emoção de poder retomar as atividades com a presença do público. "Fizemos questão de nos organizarmos para voltar logo que a possibilidade nos fosse dada, para permitir que as pessoas fora dos grupos de risco pudessem recomeçar a experiência eclesial de celebrar a eucaristia na casa", diz. Apesar de as missas online continuarem, ele afirma que muitas pessoas sentem falta da comunhão concreta, presencial.
Na Paróquia Bom Jesus do Vale, em Nova Lima, as celebrações presenciais ainda não foram retomadas. Padre Alexandre Fernandes afirma que a igreja está se preparando e que deve reabrir para as celebrações no final de julho, inicialmente apenas aos finais de semana, com menos horários. Enquanto isso, não só as missas estão sendo online - com cerca de 6 mil participantes ao vivo -, como todas as atividades da paróquia são por plataformas digitais. A catequese, com 180 alunos, está sendo realizada remotamente, assim como o curso de noivos e a crisma (com 400 jovens).
A Bom Jesus contratou uma empresa especializada em higienização e desinfecção, que será responsável por fazer a limpeza da igreja entre as celebrações, quando forem retomadas. Elas terão espaço para 120 pessoas, menos de 20% da capacidade total, que é de 700. Além disso, segundo padre Alexandre, não serão deixados, do lado de fora, itens que incentivem a aglomeração de pessoas no entorno do templo, como cadeiras, telas ou aparelho de som. Em tempos pré-Covid-19, o lado de fora da igreja costumava ter dezenas de pessoas, que não conseguiam lugar no interior. "Acho que é importante sabermos que nós não estamos sozinhos nesta caminhada. Mesmo indo à celebração sem poder se abraçar, apertar as mãos, estamos juntos", diz Padre Alexandre.