Tem-se percebido aumento de casos de suicídio e de tentativas de suicídio durante a pandemia?
Os últimos dados oficiais no Brasil, divulgados este ano, são de 2018. Ainda vai demorar um tempo para sabermos os números de 2020. Contudo, especialistas apontam que muito possivelmente as taxas de suicídio vão aumentar.
A que se deve esse aumento, exatamente?
A atenção da família também está mais dispersa, devido à pressão em todos os membros?
Não há como afirmar, mas é possível que sim. Todos estão mais preocupados e ansiosos. Com isso, talvez uma ansiedade aumentada em outra pessoa pode passar sem ser notada e, eventualmente, não levar os familiares a procurar ajuda profissional.
Os sintomas, entre adultos, de depressão, podem ser diferentes dos "clássicos" devido ao contexto tão atípico pelo qual estamos passando?
Acredito que os sintomas sejam os mesmos classicamente descritos, como perda de interesse, falta de energia, distúrbios de sono, pensamentos de morte. Uma questão avaliável a mais é o aumento dos níveis de ansiedade. A ansiedade é uma sensação fisiológica que todos temos em certo nível. Ela é preocupante quando interfere em nosso funcionamento: na qualidade do sono, na falta de foco para concluir tarefas, ou ao gerar sofrimento na pessoa, que não consiga suportá-la.
Em relação a jovens, acredita que aumentarão casos de depressão, de suicídio?
Alguns estudos mostram que jovens são mais susceptíveis a esses sintomas de ansiedade e depressão do que idosos neste momento. É curioso, porque os idosos são grupo de risco. Os estudos mostram essa associação, mas não explicitam a causa. Talvez o idoso seja mais resiliente, por já ter passado por situações de vida mais difíceis. Outro fator é o nível sócio-econômico. Quanto menor o nível sócio-econômico, mais susceptível é a pessoa, o que é fácil de explicar. Essa faixa da população está mais vulnerável e, consequentemente, mais ansiosa e deprimida neste momento. Já as pessoas que atravessam essa quarentena com crianças parecem estar mais protegidas, apesar de todo o estresse de ficar em casa com filhos em aula remotas, etc.
Os adolescentes estão em um momento de muito consumo de telas, pois a escola é na tela, conversa com amigos na tela, diversão na tela. Como saber o que é necessário neste período ou o que é excesso?
Isso é mesmo uma questão, pois sabemos que o número de horas de telas está associado a mais adoecimento mental. Mais de cinco horas por dia seria preocupante. Por outro lado, estamos em momento atípico, em que é preciso o uso das telas até para a escola. Mas mesmo neste momento, é preciso tentar ter outras atividades longe da tela. Fazer fora dela tudo para o que ela não for necessária.
Em crianças e adolescentes, o que são sintomas de que algo não vai bem?
Pior desempenho na escola, reclusão, redução na alimentação e alterações no sono. No caso de adolescentes também maior irritação que o normal. O que vai chamar atenção em um primeiro momento é menos a verbalização e mais alteração de comportamento. Se familiares perceberem que o filho ou filha está com dificuldades, passando este período de maneira não muito adequada, devem procurar ajuda profissional.
Gostaria de deixar alguma mensagem final?
Neste período de pandemia é natural que pessoas fiquem mais inseguras, mais ansiosas. Se precisarem, devem procurar ajuda profissional, e precisamos ter a estrutura de saúde pública para isso.
Prevenção ao suicídio: onde procurar ajuda
- Em casos de emergência: SAMU 192, UPA, Pronto-socorro, Hospitais
- Serviços de saúde: Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e Unidades Básicas de Saúde
- Centro de Valorização da Vida: Telefone 181 (ligação gratuita) ou www.cvv.org.br para chat, e-mail. O CVV realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, email e chat 24 horas todos os dias