Revista Encontro

SAÚDE

Quais são as sequelas da Covid-19 e os cuidados necessários depois da infecção

Especialistas do mundo todo estão investigando as sequelas que o novo coronavírus pode causar. Alterações cognitivas, fadiga e dor de cabeça estão entre as principais consequências da doença

Rafael Campos
Covid-19 ainda é um mistério para a classe médica: profissionais recomendam check-up depois da fase aguda da doença - Foto: Freepik
A temporada da Covid-19 no Brasil está completando praticamente um ano. Muito já se sabe sobre o percurso e as ações do vírus Sars-CoV-2 no organismo humano. Isso não quer dizer, no entanto, que a doença tenha se tornado menos desafiadora. Cientistas e médicos estão debruçados sobre as sequelas que a infecção pode causar, duradouras ou passageiras. Uma grande incógnita é entender porque as consequências variam tanto entre os pacientes. Hoje, não há um protocolo rígido e universal sobre como os recuperados devem agir, mas há médicos que recomendam o tradicional check-up depois da fase aguda da doença.

Karla Finotti, pneumologista da Rede Materdei: "Idosos com comorbidades são acompanhados de três a quatro semanas após o início dos sintomas" - Foto: Pádua de Carvalho/EncontroDe forma geral, idosos e demais pacientes que estiveram internados, com ou sem a necessidade de ventilação mecânica, recebem orientação de acompanhamento no próprio hospital. E o tempo pode variar conforme cada caso. Alguns centros médicos montaram ambulatórios para atender apenas pacientes que tiveram a infecção, são os chamados "Pós-Covid".
A Rede Materdei implantou recentemente o Check-up Pós-Covid. A coordenadora médica do programa, Carla Tavares, explica que na avaliação inicial o paciente passará por uma consulta detalhada para definir em qual perfil de risco se encaixa em cada um dos sistemas que podem ser afetados pela Covid-19 (pulmonar, cardiovascular, urinário, neurológico, além da saúde mental). "A partir dessa estratificação de risco, o paciente será encaminhado aos especialistas necessários, realizará os exames que forem recomendados com atendimento personalizado, acompanhamento próximo, indicação do melhor tratamento e orientações para otimização da recuperação pós-covid", afirma a médica.

Clínico geral e pneumologista Marcelo Miranda: "Para sermos muito criteriosos, sempre peço para os pacientes, após 15 dias da fase aguda da doença, repetirem o teste dos marcadores inflamatórios que vão indicar se há ainda processo inflamatório em andamento" - Foto: Pádua de Carvalho/EncontroKarla Finotti, pneumologista da Rede Materdei, afirma que "idosos com comorbidades são acompanhados de três a quatro semanas após o início dos sintomas".  Segundo a especialista, pacientes que desenvolveram a forma mais grave da doença podem ter fibrose pulmonar, que é quando surgem espécies de cicatrizes que acabam prejudicando o seu funcionamento. No entanto, as consequências da doença estão longe de se encerrar no trato respiratório que é por onde, geralmente, a infecção se instala. Isso tem uma explicação: o novo coronavírus é caracterizado por causar uma resposta inflamatória sistêmica e exacerbada no organismo, o que pode prejudicar outros órgãos além do pulmão, como coração, rins, fígado e até o cérebro. "Geralmente, quem desenvolve sequelas no pulmão e coração, por exemplo, são pacientes que precisaram de socorro médico", diz Karla, respondendo à pergunta se assintomáticos também podem ter sequelas graves.

Marco Morel, médico especializado em neurologia, está acompanhando de perto casos que ilustram a pesquisa. "Sabemos que essas manifestações atingem o sistema nervoso central e periférico. E podemos dividir essas manifestações entre agudas e crônicas" - Foto: Arquivo pessoalMarcelo Miranda Mertens, clínico geral e pneumologista, enumera as principais sequelas que tem registrado em seu consultório: fadiga, dor de cabeça frequente, alteração na função cognitiva (perda de concentração, de memória e desorientação), perda de paladar e olfato. "Para sermos muito criteriosos, sempre peço para os pacientes, após 15 dias da fase aguda da doença, repetirem o teste dos marcadores inflamatórios que vão indicar se há ainda processo inflamatório em andamento", afirma.

Ainda é difícil dizer quem deve desenvolver sequelas ou se elas serão definitivas. "Trata-se de uma doença nova e ainda não tivemos tempo de observação necessário", diz Leonardo Meira de Faria, médico intensivista e pneumologista do hospital Felício Rocho. Conforme o médico há ainda outro agravante: a infecção pode ser um gatilho para a piora de doenças já diagnosticadas nos pacientes. "Ela pode descompensar doenças crônicas já existentes." Para Leonardo, pacientes que tiveram a forma leve da doença devem ficar atentos a possíveis alterações depois da fase aguda da infecção, como fadiga e até alopécia (repentina perda de cabelo). Se notar algo errado, precisa buscar ajuda médica. "Cerca de 80% dos pacientes que tiveram sintomas leves só desenvolvem um estado gripal, que carece apenas de repouso e hidratação", afirma.

Filipe Prohaska, infectologista do Grupo Oncoclínicas sobre pacientes onco-hematológicos: "Infelizmente, com as novas cepas há uma necessidade de ter um cuidado redobrado para entendermos o que elas significarão para esse perfil de paciente"  - Foto: DivulgaçãoPacientes em tratamento ou com histórico de câncer também devem se resguardar. "Independentemente de estar em tratamento ou não, são pacientes que já têm esse risco.
O risco pode ser ainda maior a depender do tratamento que está sendo induzido e até mesmo a depender da fase do tratamento contra o câncer em que ele se encontra", afirma Filipe Prohaska, infectologista do Grupo Oncoclínicas, sobre pacientes onco-hematológicos imunossuprimidos. "Infelizmente, com as novas cepas há uma necessidade de ter um cuidado redobrado para entendermos o que elas significarão para esse perfil de paciente", completa.

Alterações neurológicas também vêm sendo registradas e investigadas. Conforme estudo por meio do jogo digital MentalPlus, criado pela neuropsicóloga Lívia Stocco Sanches Valentin, 80% dos participantes da pesquisa mostraram alterações cognitivas após a fase aguda da doença como dificuldade de concentração ou atenção, perda de memória ou dificuldade para lembrar-se das coisas, problemas com a compreensão, dificuldades com o raciocínio e julgamento e problemas na execução de tarefas simples. O estudo foi feito no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

Leonardo Meira de Faria, médico intensivista e pneumologista do hospital Felício Rocho: "A Covid-19 pode descompensar doenças crônicas já existentes" - Foto: Pádua de Carvalho/EncontroMarco Morel, médico especializado em neurologia, está acompanhando de perto casos que ilustram a pesquisa. "Sabemos que essas manifestações atingem o sistema nervoso central e periférico. E podemos dividir essas manifestações entre agudas e crônicas", diz o médico que atende no hospital Life Center e na Rede Materdei. Cefaleia (dor de cabeça), epilepsia, confusão mental, crise de ansiedade, perda de concentração estão entre alguns dos problemas notados. Além, é claro, da perda de paladar e do olfato, parcial ou definitiva, sintomas bem comuns. Mas, conforme o médico, há tratamento para todas essas sequelas.

Especialistas compartilham da ideia de que não há motivos para pânico. Quem já foi infectado e se recuperou deve ficar atento a possíveis alterações em seu organismo e buscar ajudar caso note que os sintomas vêm piorando.
Enquanto a vacina não alcançar toda a população, continua valendo a mesma recomendação: mantenha o distanciamento social, use máscara e álcool em gel.
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