
Lidar com emoções como angústia, raiva e baixo astral nunca foi fácil. Mas reconhecer os sentimentos é o primeiro passo para caminhar adiante, repetem os especialistas. É fato que às vezes quem se sente triste acaba se vendo um pouco fora do lugar, como se fosse indesejado, fora do contexto. Nas redes sociais, posts dos superpositivos incentivam a ver sempre o lado otimista. Esse pensamento, segundo psicólogos, pode ser uma armadilha grave, uma auto-enganação. Cedo ou tarde será necessário enfrentar os incômodos. "A obrigação de ser feliz gera uma angústia muito grande", define a psicóloga Renata Borja, especialista em terapia cognitivo comportamental. Segundo ela, muitas vezes a pessoa que não se sente eufórica na sua rotina acaba ficando mal, até por acreditar que não tem tanta energia positiva como o mundo parece transbordar. Como ninguém é feliz o tempo inteiro, a positividade tóxica é exatamente a exacerbação de um sentimento de otimismo a ponto de a pessoa não enxergar a realidade e escolher encobrir os problemas. "Não há mal em não se sentir bem. A partir de uma situação ruim eu posso conseguir caminhos para transpor as dificuldades", diz Renata. Ela reforça que a felicidade é um conceito muito mais profundo do que ter uma vida só de bons momentos. "O que vai determinar o bom e o ruim é o nosso comportamento. Eu posso sentir raiva e usá-la para atingir objetivos. Transformar minha ansiedade em um alerta que poderá me proteger."
Boa parte do charme do filme está no fato de a vida real ser capaz de comover diante de uma supervalorização da felicidade. O psicólogo e especialista em gestão de pessoas Anderson Rodrigues lembra que, no período da pandemia, ansiedade, medo e luto se tornaram exemplos de sentimentos que foram aflorados e que tentar isolá-los dentro de uma áurea de positividade é um descompasso e pode trazer efeito contrário. A oscilação de humor de acordo com as experiências que experimentamos é algo esperado, segundo o psicólogo. Reprimir as emoções negativas, ou desreguladas é quase uma tentativa de invalidar as emoções, ou seja, tentamos dispensar os problemas ou desafios para que eles não nos tragam sentimentos ruins. "Esse movimento cria a ideia de que para termos saúde, qualidade de vida, precisamos excluir pensamentos e sentimentos negativos do nosso dia a dia", diz. O que, ao contrário do que parece, não é nada bom. "As emoções exercem um papel importante nas nossas vidas, informam o que está acontecendo com a gente e nos ajudam a enfrentar de forma adequada a situação que vivemos. As oscilações são indicadores de saúde mental."

A coach de carreira e especialista em psicologia positiva Lidiane Cordeiro lembra que não existe um prazo para curar-se da dor ou superar uma dificuldade. E muito menos uma fórmula a seguir para vencer esses desafios, já que a solução de cada um é uma construção única. A busca por receitas prontas e caminhos curtos, negligenciando emoções como a tristeza, o desalento, desamparo ou mesmo o tédio, só tem um destino: a comparação, que pode provocar o efeito contrário do que se procura. "O crescimento dessa busca por fórmulas prontas somado ao crescimento, ainda mais durante a pandemia, dos incontáveis cursos online, palestras e lives, possivelmente alastrou o efeito colateral da positividade, a positividade tóxica", alerta Lidiane.

Aceitar os dois. Valorizar o que merece e procurar desenvolver e melhorar o que precisa de atenção. Há muitas maneiras de se buscar isso."Um personagem conhecido é a Pollyana, a menina que fazia o jogo do contente para conseguir ver sempre o lado bom das coisas. Seria a Pollyana tóxica em nossos tempos? Para Raquel Negri, não. "A Pollyana do livro encontrou esse jeito de viver porque também fazia parte da personalidade dela ser uma pessoa mais leve", afirma. "O que eu gosto na personagem é o fato de ela enxergar nas pessoas com quem convivia suas boas características." E todos nós somos assim, um misto de "sombra e luz". Para Raquel, o modelo saudável de lidar com as emoções pode ser definido por uma frase da ioga: "o melhor caminho é o do meio."