Alexandre Poni e Hallison Moreira contam que o serviço cinco-estrelas está no DNA da rede: "Sempre pensamos em como podemos surpreender quem vem às nossas lojas", diz Alexandre - Foto: Uarlen Valério/EncontroVisitar a primeira loja do Verdemar, localizada na Rua Viçosa, no bairro São Pedro, é como entrar em uma espécie de túnel do tempo para os dois sócios do grupo, Alexandre Poni e Hallison Moreira. Basta pisar na calçada para começarem a receber os cumprimentos não apenas de antigos funcionários como de clientes dos tempos em que eles precisavam "vender o almoço para pagar o jantar", como costumam falar. "Lembro de quando, para conversar com vocês, tínhamos de ir até o fundo da loja para subir ao escritório, que ficava em um mezanino", contou um senhor que não escondia a alegria em ver os "meninos", em uma tarde do mês de abril. "Ia muito com um grupo de amigos em hipermercados para comprar cerveja em promoção para eles venderem aqui", disse um outro.
Os irmãos Antônio e José Di Spirito, proprietários da Big Pão: "Muitos nos perguntam o que víamos no Alexandre e no Hallison para ajudarmos, lá no começo. Eles eram batalhadores. Nós ajudamos porque também fomos ajudados no nosso início", diz seu Zé - Foto: Uarlen Valério/EncontroLembranças como essas estão presentes no dia a dia de Alexandre, de 53 anos, e Hallison, de 55. Mas voltar a elas é mais frequente no momento em que o Verdemar comemora três décadas de existência. Com 16 unidades espalhadas pela Grande BH e 1,2 bilhão de faturamento anual, a rede que mudou o hábito de consumo do belo-horizontino com sua impressionante variedade de produtos (são 23 mil itens nas prateleiras) e seu atendimento quase individualizado surgiu do desejo empreendedor dos dois jovens que se conheceram na faculdade de administração de empresas do Centro Universitário Una, no início da década de 1990. Alexandre trabalhava na mercearia de sua mãe, Edi Brugnara Poni, no Santo Antônio. Hallison, então, sugeriu trazer queijo artesanal de sua cidade natal, Guanhães, localizada a 240 quilômetros da capital, para o amigo vender para padarias e mercadinhos de bairro.
"O Alexandre tinha uma picape Pampa e me disse: ‘Eu tenho um carro e você o canal do queijo, vamos fazer uma sociedade?’."
A primeira loja da rede, no São Pedro, na década de 1990: sócios pagaram 7,5 mil dólares para virarem "donos de supermercado" - Foto: DivulgaçãoEntram aí dois personagens essenciais na trajetória dos jovens empresários: José e Antônio Di Spirito, proprietários da padaria Big Pão. Alexandre sempre deixava para fazer a última entrega do dia no estabelecimento dos irmãos, no Luxemburgo. Ali, perguntava como era administrar um lugar daqueles e dava muitos palpites. "Seu Zé e Toninho se encantaram com o Alexandre", afirma Hallison. O que era uma relação comercial se transformou em grande amizade. Tanto que muitos achavam que os irmãos eram, na verdade, tios do universitário. "E para não ter de explicar muito, eu falava que eram meus tios mesmo", diz Alexandre. Não demorou para o jovem começar a ajudá-los nas compras. Negociando grandes volumes, conseguia adquirir produtos com melhores condições para a mercearia da mãe.
Segunda geração: filho mais velho de Alexandre, Enzo Chiari Poni, de 17 anos, já começa a acompanhar o pai pelos corredores do Verdemar - Foto: Uarlen Valério/EncontroNessa época, um corretor perguntou se Alexandre não gostaria de comprar o Verdemar (antiga mercearia Cobal, no São Pedro, que acabara de mudar de nome). Gostaria, claro, mas com que dinheiro? Fez uma proposta que imaginava seria rejeitada: seis meses de carência, cinco parcelas de 1 mil dólares e mais cinco parcelas de 500 dólares. Os donos toparam. Chamou para a empreitada dois amigos, Hallison e José Carlos Júnior, o Juninho, que deixou a sociedade em 2000. Como nenhum deles tinha esse dinheiro disponível, foi necessária uma "engenharia financeira".
Juninho, por exemplo, vendeu um Opala Comodoro preto. Já Hallison convenceu o irmão a vender o telefone de casa e alugar a mesma linha - ele era músico e, por causa do contato para shows, não podia perder o número. Reuniram, assim, os 7,5 mil dólares necessários para começar o negócio.
Queijos, vinhos, pães e hortifrutis: preocupação com organização para encantar o cliente pelo olhar - Foto: Uarlen Valério/EncontroEm março de 1993, a empresa tinha apenas três funcionários. Amigos dos sócios faziam as tais rondas por hipermercados em busca de produtos em promoção. A estratégia era assim: com inflação galopante (naquele ano, o IPCA foi de 2.477%), redes grandes, que conseguiam prazo com os fornecedores, colocavam produtos em promoção para vender rápido e aplicar os ganhos no mercado financeiro. Mas impunham um limitador do tipo "apenas cinco unidades por cliente". Por isso, era necessário que várias pessoas participassem das rondas para garantir uma quantidade de produtos razoável. Quando a promoção acabava e o preço nos hipermercados voltava ao normal, o Verdemar tinha em suas gôndolas produtos mais baratos que os concorrentes. "Os clientes não entendiam como conseguíamos preços mais baixos", lembra Hallison. "Mal sabiam eles que havíamos comprado nesses mesmos concorrentes." Uma curiosidade: como nessa época os produtos recebiam, cada um, uma etiqueta com preço, os amigos ainda precisavam retirá-las para que o funcionário do Verdemar colocasse a etiqueta do supermercado.
Edward Soares, o Tátá, superintendente industrial, é responsável pela fabricação dos 1,1 mil itens entre produtos de padaria, confeitaria e rotisseria: "Temos clientes que vêm às lojas duas vezes ao dia, atrás de pão quente de manhã e à tarde, por exemplo" - Foto: Uarlen Valério/EncontroA nova virada veio, mais uma vez, com a ajuda dos proprietários da Big Pão.
"Víamos que os meninos trabalhavam muito, mas nunca sobrava dinheiro", diz Toninho. Eles sugeriram que o Verdemar investisse em padaria. Ter pão e outros produtos fresquinhos sempre no balcão fez com que o consumidor que ia ao mercado uma vez ao mês passasse a frequentá-lo diariamente. O primeiro forno veio da própria Big Pão. "Muitos nos perguntam o que víamos no Alexandre e no Hallison para ajudarmos, lá no começo. Eles eram batalhadores. Nós ajudamos porque também fomos ajudados no nosso início", conta seu Zé. É por isso que os donos nunca quiseram retirar a palavra padaria da marca "Verdemar: Supermercado e Padaria". Outra marca dos primeiros anos do Verdemar também tem uma mãozinha da Big Pão: o pastel. "O pasteleiro fazia a massa na Big Pão de manhã e à tarde vinha para o Verdemar, deixar a massa pronta para fritarmos no dia seguinte", afirma Alexandre. "Chegamos a vender 1,5 mil unidades por dia. Tinha fila para provar o nosso pastel,que na época custava 1 real." Grandão e bem recheado, ele é vendido, com sucesso, até hoje.
O superintendente de operações Carlos Melo: "O cliente que precisar de um funcionário sempre encontrará um disponível. Além do padrão de conforto e de serviços em todas as lojas, esse é um ponto essencial para nós" - Foto: Uarlen Valério/EncontroAtualmente, são fabricados na indústria da companhia 1,1 mil itens, entre produtos de padaria, confeitaria e rotisseria, sob a supervisão do superintendente industrial Edward Soares, o Tatá, que está no grupo desde 2005 e coordena em torno de 1,2 mil pessoas. A fábrica central fica no Sion, mas todas as unidades dispõem de padarias próprias para os produtos frescos. "Temos clientes que vêm às lojas duas vezes ao dia, atrás de pão quente de manhã e à tarde, por exemplo", diz. O destaque é, claro, o premiadíssimo pão de queijo (vencedor em sua categoria em todas as edições especiais Encontro Gastrô - O Melhor de BH). Todos os dias, são produzidas 3,3 toneladas de massa. Além das versões já assadas, há oito congeladas. "A receita é segredo, mas posso garantir que a quantidade generosa de queijo, a qualidade de todos os insumos utilizados e o padrão da fabricação são o diferencial", afirma Tatá. Todos os meses são importados da França 20 toneladas de farinhas especiais para a confecção de croissants, brioches e pães rústicos.
O controller Carlos Furiati, fala sobre a profissionalização do grupo nos últimos 20 anos: "Posso dizer que o Verdemar não mudou apenas da água para o vinho, mas para o vinho mais caro que existe" - Foto: Uarlen Valério/EncontroEscutar os clientes e atender a suas necessidades é uma missão desde os primeiros anos do Verdemar. Hallison lembra que a loja do São Pedro era cercada por edifícios baixos, sem elevador na maioria das vezes. "Conhecíamos os vizinhos pelo nome e levávamos as compras até o apartamento deles", conta. "Fomos a primeira loja do Brasil a ter embalador." A situação era tão incomum que entregadores ganhavam não só gorjetas, mas presentes dos clientes. "Trouxemos essa experiência das feiras, onde eu mesmo fui carregador", diz Alexandre. "Sempre pensamos em como podemos surpreender quem vem às nossas lojas." No grupo há 17 anos, o superintendente de operações Carlos Melo zela para que esse modelo seja mantido. "O cliente que precisar de um funcionário sempre encontrará um disponível", afirma. "Além do padrão de conforto e de serviços em todas as lojas, esse é um ponto essencial para nós." Os números comprovam essa excelência. Entre as 150 maiores redes do Brasil, de acordo com o último ranking da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), o Verdemar é o que tem o maior número de funcionários por metro quadrado: 20,3. Para efeito de comparação, as cinco maiores do país têm, em média, 5,7 funcionários por metro quadrado.
Na segunda metade da década de 1990, com o negócio - e o país - mais estabilizado, Alexandre e Hallison puderam investir em qualidade. Em 1996, foram a sua primeira feira de varejo, em Chicago. Como uma irmã de Hallison morava em Nova York, aproveitaram para esticar a viagem. Ficaram impressionados com algumas operações de varejo, em especial empórios como Balducci’s e Dean & DeLuca. Voltaram com a ideia de um supermercado que não vendesse apenas "produtos a granel e latinhas", mas itens do mundo inteiro. Queriam inovar também no layout e levaram para a loja do São Pedro móveis de madeira de demolição que garimpavam em Tiradentes. "Os clientes elogiavam e diziam que havia ficado lindo. Mas perguntavam: ‘Quando vocês vão pintar as estantes?’", conta Hallison. Também surgiram nessa época os famosos arcos da loja 1. Os sócios queriam aumentar a área de vendas, mas para isso precisavam derrubar uma parede grossa, que servia de arrimo. Chamaram um engenheiro da Copasa, que deu a ideia de quebrar as pedras, mas deixar os arcos, "como na Roma antiga". Como a parede era grossa demais, foi necessário um maquinário específico. "Os vizinhos entraram em pânico, ligaram para a polícia e disseram que íamos derrubar o prédio", diz Alexandre. "Até explicarmos que havíamos feito um estudo de engenharia, foi um trabalhão."
O premiadíssimo pão de queijo da rede: todos os dias são produzidas 3,3 toneladas de massa - Foto: Uarlen Valério/EncontroNessa mesma época, os empresários começaram a trazer produtos que ou não eram encontrados por aqui ou eram vistos apenas em prateleiras de delicatessens. A ideia era que se alguém tivesse uma receita para fazer, pudesse encontrar todos os ingredientes no Verdemar. Nada de comprar uma parte no supermercado, outra na loja de bebidas e outra só no Mercado Central. Eles mesmos começaram a se sofisticar. "Fiz um curso de vinho e comecei a procurar importadores para trazer rótulos de diversas regiões produtoras para o supermercado", diz Alexandre, que se lembra também de quando fez uma promoção de salmão. Os clientes olhavam, achavam o preço bom e o peixe lindo, mas não levavam porque não sabiam como fazer. Alexandre encontrou uma receita simples, com manteiga e alcaparras no laminado, e distribuiu para ajudar quem queria se aventurar em um prato novo. "Arrebentamos de vender."
Com a profissionalização do grupo, casos assim, de puro "feeling", ficaram raros. Hoje, cada passo é muito bem estudado e a equipe de executivos tem reuniões semanais com representantes da consultoria Falconi para avaliar o caminho adotado. "Posso dizer que o Verdemar não mudou apenas da água para o vinho, mas para o vinho mais caro que existe", afirma o controller Carlos Alcino Furiati, que entrou no grupo há 21 anos. Ele lembra que, no início da década de 2000, ainda se pagava empregados com dinheiro. "Funcionários retiravam dinheiro do caixa, envelopavam e entregavam para os colegas." Outra mudança significativa foi em relação ao faturamento. Em 2002, o Verdemar faturou 34 milhões de reais. Em 2022, mais de 30 vezes esse valor.
Com pouco mais de 50 anos, tanto Hallison quanto Alexandre dizem que ainda não se preocupam com processo de sucessão na empresa. Mas Enzo Chiari Poni, filho mais velho de Alexandre, já começa a acompanhar o pai pelos corredores do Verdemar. Aos 17 anos, o aluno do terceiro ano do curso técnico em administração do Sebrae ainda não decidiu que faculdade irá cursar, mas mostra-se empolgado em ver o "carinho" que o pai tem pelo trabalho. "Apesar de ser muito ligado à família, posso dizer que a vida dele é o Verdemar."
Os planos de Alexandre e Hallison para a rede são ambiciosos. Nos próximos três anos, eles pretendem abrir mais sete lojas: três em Nova Lima (no shopping Himalaya, no Vila da Serra; em Alphaville; e ao lado do condomínio Village Terrasse), uma no Belvedere, uma em Lagoa Santa e mais duas em outros dois bairros na Zona Sul de BH, ainda em sigilo. "Pode parecer muito, mas não estamos atrás de crescimento a qualquer custo. Temos o nosso pé no chão", diz Alexandre. "Ao mesmo tempo, achamos importante estarmos cada vez mais perto dos nossos clientes. É uma ideia até sustentável para que as pessoas precisem se deslocar cada vez menos." Essa expansão está ligada à maneira com que Alexandre e Hallison entendem o negócio que criaram. "Queremos que os clientes venham até nós, se encantem e se surpreendam", diz Hallison. "Acreditamos na frase ‘o que os olhos veem, o coração sente’." Por isso mesmo, o e-commerce representa uma fatia pequena do faturamento, algo em torno de 3%. Para corroborar a tese, Alexandre cita como exemplo a National Retail Faire (NRF), maior feira de varejo do mundo, realizada anualmente em Nova York. Segundo ele, em 2022 o tema mais discutido havia sido o metaverso e suas implicações nas vendas. "Este ano, ninguém queria saber de internet, só de loja física", afirma. "Até as grandes redes de comércio virtual estão se rendendo aos espaços físicos."
Apesar da abertura de novas lojas, da profissionalização da equipe e do faturamento bilionário, uma coisa ainda continua tão fresca na mente de Alexandre e Hallison quanto naqueles tempos em que ir a feiras internacionais era quase uma aventura e a "rede" se limitava à loja do São Pedro: a busca incessante pela qualidade e pelo atendimento impecável. O que faz o Verdemar ser conhecido como "a disneylândia da gastronomia". E não apenas dentro das divisas de Minas Gerais.
Três décadas de crescimento : expansão do grupo teve início nos anos 2000 e se intensificou a partir de 2010
- 1993 - Compra de uma pequena mercearia na rua Viçosa, no bairro São Pedro, já chamada Verdemar
- 2001 - Inauguração da segunda loja, no Sion, que depois de diversas reformas e ampliações conta hoje com 2,4 mil metros quadrados de área de venda. É onde funcionam também as áreas administrativa, financeira e industrial
- 2004 - Abertura da unidade do Buritis, quando o bairro ainda era uma aposta
- 2007 - Modernização da primeira loja, no bairro São Pedro, e inauguração da unidade complementar, na contra-esquina, focada em hortifrúti e peixaria
- 2009 - Chegada ao DiamondMall. Ainda hoje é a loja com maior venda por metro quadrado
- 2010 - Abertura da unidade Jardim Canadá e incorporação da Padaria Cataguases, que pertencia à família de Alexandre Poni desde 1992
- 2011 - Inauguração da unidade Raja Gabaglia
- 2016 - Criação da loja da Savassi, na rua Fernandes Tourinho
- 2017 - Abertura de quatro novas lojas: Pampulha, que conta com uma vista privilegiada da lagoa; Serra; Pátio Savassi; e Castelo
- 2018 - Inauguração da loja do bairro Luxemburgo
- 2019 - Abertura da loja Cidade Nova
- 2020 - Inauguração da Verdemar Romanina, que mantém o nome da conhecida padaria do Prado
Sacola de plástico, aqui, não!
Em 2012, o Verdemar lançou uma de suas estratégias de marketing mais conhecidas: as sacolas ecológicas, assinadas pelo estilista Ronaldo Fraga. Desde então, a rede não dá e não vende sacolas plásticas. Os clientes têm a opção de utilizar caixas de papelão ou adquirirem as sacolas retornáveis. “Somos o único grupo do Brasil a manter a prática”, diz Hallison. “E os nossos clientes aceitaram e aceitam muito bem.” Em comemoração ao 30º aniversário, o Verdemar lançou um concurso cultural para selecionar ilustrações de oito mineiros que irão estampar a nova coleção de sacolas retornáveis (veja algumas ao lado). Cada um dos selecionados ganhou um prêmio de 15 mil reais.
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