Revista Encontro

NEGÓCIOS

Minas Gerais alcança segundo lugar na produção de cana-de-açúcar

Ações como a do empresário José Francisco dos Santos, que anunciou investimentos de 3,5 bilhões de reais, tem feito o estado subir no ranking

Alessandro Duarte e Daniela Costa
José Francisco dos Santos, presidente do conselho de administração da CMAA: "Nosso investimento será em tecnologia. Não iremos aumentar a área plantada, mas vamos expandir a capacidade de moagem e a produção de açúcar e etanol" - Foto: Uarlen Valerio/Encontro
Em seu discurso no evento de lançamento da safra de cana-de-açúcar 2024/2025, em Uberaba, no fim de abril, o governador Romeu Zema destacou a importância do agronegócio para a economia de Minas Gerais. "O agro tem puxado nosso estado adiante", disse. "Ano após ano, ele tem crescido acima dos outros setores, o que é muito bom para não sermos tão dependentes da mineração." Foi aplaudido efusivamente por todos os presentes. Zema destacou que, em 2018 (ano em que foi eleito), a economia mineira representava 8,8% do total nacional. Hoje, esse número saltou para 9,5%. "Se continuarmos nessa trajetória é só questão de tempo para sermos a segunda economia do Brasil." Foi bastante aplaudido mais uma vez.
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Organizada pela Companhia Mineira de Açúcar e Álcool (CMAA) e pela Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig Bioenergia), a festa em torno da cana reuniu, além do governador mineiro, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira; o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Carlos Fávaro; a senadora e ex-ministra Teresa Cristina; e o presidente da Assembleia Legislativa de Minas, Tadeu Martins Leite, o Tadeuzinho; entre muitos outros políticos e empresários. Tamanha concentração de pesos-pesados se justifica. Entre os principais produtos do agro brasileiro, a cana-de-açúcar ocupa lugar de destaque. Está na terceira posição entre os de maior valor bruto de produção, atrás apenas da soja e do milho. Com mais de 80 milhões de toneladas produzidas na safra 2022/2023, Minas ultrapassou Goiás e se tornou o segundo maior estado produtor, atrás apenas de São Paulo. "Minas tem algumas características que são muito importantes para esse destaque: estrutura logística adequada, boa capacidade de produção instalada, mão de obra capacitada, grupos econômicos sólidos e um mercado interno grande e desenvolvido", afirma Mário Campos, presidente da Siamig Bioenergia, entidade que é o principal canal de interlocução entre as empresas de bioenergia, o governo e a sociedade civil. O Brasil lidera a produção mundial sucroalcooleira e Minas responde por 11,4% da produção nacional.
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Romeu Zema assina o protocolo de investimentos da CMAA na festa de abertura da safra 2024/2025: para o governador, "o agro tem puxado nosso estado adiante" - Foto: Edy Fernandes/EncontroA preparação para o avanço da cana-de-açúcar no estado começou há 20 anos, com a implantação da colheita mecanizada e o fim da queima da palha (hoje raríssima por aqui). Também foram inseridas variedades mais adaptadas ao solo mineiro e feito um importante trabalho para a ocupação ordenada das usinas, que não podem ficar muito distantes das plantações, já que a cana é um produto perecível, e nem muito próximas umas das outras, para que não haja concorrência predatória. Nada disso, no entanto, seria suficiente não fosse o investimento de empreendedores como o presidente do conselho de administração da CMAA, José Francisco dos Santos, de 69 anos, que anunciou um aporte de 3,5 bilhões de reais até 2033 para expandir sua produção de 10 milhões de toneladas para 18 milhões de toneladas por ano, o que faria dele o maior usineiro do estado. "Esse investimento será em tecnologia. Não iremos aumentar a área plantada, mas vamos expandir a capacidade de moagem e a produção de açúcar e etanol", diz José Francisco. A CMAA tem três unidades agroindustriais localizadas em Uberaba, Limeira do Oeste e Canápolis. Atualmente, as três usinas empregam 4 mil pessoas, número que deve subir para 7 mil com o investimento bilionário. Neste ano, a companhia irá faturar 3 bilhões de reais. Em 2025, 4 bilhões. Todas as usinas do grupo operam com plantio, colheita e automação industrial, o que permite extração de mais açúcar da mesma cana.
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Além de ser uma das mais importantes cadeias produtivas do agronegócio do país, o setor sucroenergético representa "uma importante alternativa de energia renovável e mitigação do risco das mudanças climáticas que impactam o planeta", como disse na festa de lançamento da safra o CEO da CMAA, Carlos Eduardo Turchetto Santos. Ele é um dos três filhos de José Francisco com Maria Angela Turchetto – Luiz Gustavo e Francisco José também atuam em empresas do grupo. O próprio governador Romeu Zema destacou que "o Brasil já tem uma solução energética tão boa quanto o carro elétrico, que é o carro a etanol". Afirmação com a qual José Francisco não concorda. "Os veículos a etanol não são ‘tão bons quanto os elétricos’ para o meio ambiente. São melhores, já que a produção de energia para abastecer a bateria nem sempre é limpa, principalmente na Europa", diz. Cerca de 12% da energia disponível na União Europeia vem de combustíveis fósseis sólidos, como carvão. Entre as muitas possibilidades do uso do etanol está o carro bioelétrico. Nele, o hidrogênio gerado por meio de uma reação química do combustível derivado da cana-de-açúcar produz eletricidade carregando a bateria que alimenta o motor elétrico. "É um modelo muito bom para o Brasil, mas também para outras partes do mundo", diz Mário Campos.
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José Francisco com o filho do meio, Carlos Eduardo Turchetto Santos, CEO da CMAA: "O setor sucroenergético representa uma importante alternativa de energia renovável e mitigação do risco das mudanças climáticas que impactam o planeta", diz Carlos Eduardo - Foto: Edy Fernandes/EncontroSétimo dos 11 filhos de uma família de agricultores de Oliveira, a 160 quilômetros de Belo Horizonte, José Francisco começou a vida profissional com a venda de batatas, aos 18 anos. Em Bebedouro (SP), uniu-se a um de seus irmãos para comercializar o tubérculo. Um pouco mais tarde, em 1972, foi trabalhar com dois irmãos ("de empregado", como gosta de salientar) na Citrosantos, empresa que comprava laranja em Bebedouro e revendia em Minas. Cinco anos depois, comprou um terço da empresa e se tornou sócio dos irmãos. Em 1985, ele montou um novo negócio, a Comcitrus, de produção de suco de laranja. Logo depois veio a JF Citrus, de produção de laranja. Foi o início da fortuna de José Francisco. A entrada no mercado de açúcar, etanol e bioeletricidade ocorreu em 2006. "Por insistência da Maria Angela", lembra José Francisco. Ele havia comprado a Fazenda Santa Vitória, em Uberaba, com a ideia de ampliar o espaço de seus laranjais. Sua mulher dizia que ele deveria diversificar os negócios. Contou com a ajuda do amigo Anderson Adauto, então prefeito de Uberaba, que já pensava em levar uma usina de álcool e açúcar para a cidade. O resto é história.
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José Francisco com a mulher, Maria Angela Turchetto: "O investimento em cana-de-açúcar surgiu depois que ela insistiu para que eu diversificasse os negócios", lembra ele - Foto: Edy Fernandes/EncontroA boa relação com políticos das mais diversas ideologias é uma das características citadas por quem conhece o fundador da CMAA. Na sétima edição da festa de abertura da safra da cana em Minas, uma foto bastante compartilhada foi a de José Francisco sentado entre os deputados federais mineiros Domingos Sávio, presidente do Partido Liberal (PL) em Minas, e Reginaldo Lopes, do Partido dos Trabalhadores (PT) e vice-líder do governo Lula na Câmara Federal. Sorridentes, os dois se dão as mãos em sinal de que as diferenças ideológicas haviam ficado do lado de fora do evento. "Eu acredito que, independentemente de ideologias partidárias, precisamos estar juntos nos principais temas de Minas. E isso é feito aqui neste evento onde estão reunidos o Governo do Estado, o Governo Federal, a Assembleia de Minas, o Congresso Nacional, o setor produtivo e todos a favor do setor sucroenergético, que é dos mais importantes do país", disse o presidente da Assembléia Legislativa, Tadeu Martins Leite.
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A usina Vale do Tijuco, em Uberaba: uma das três unidades do grupo CMAA - Foto: Edy Fernandes/EncontroAtualmente, apesar de participar das decisões de seu grupo, são seus filhos que tocam o dia a dia dos negócios. "Tenho orgulho de dizer que os criei para serem meus sucessores e não herdeiros", afirma. Andar de cavalo Mangalarga Marchador, criado na sua fazenda Santa Zélia, em Bebedouro, é o lazer predileto de José Francisco nos fins de semana. Um de seus hobbies é reunir os amigos em cavalgadas anuais entre as cidades de Oliveira e Ritápolis, em Minas, em um trajeto de 60 quilômetros. Se alguém diz que não pode ir porque não tem um cavalo adequado, ele empresta um animal de sua criação. Não é por falta de montaria que ele deixaria alguém para trás. "Gosto de estar com os amigos. Na festa de lançamento da safra da cana, o melhor momento é quando os políticos e autoridades já foram embora, nos sentamos em volta dos tocadores de viola e ficamos cantando juntos, comendo uns petiscos da roça e tomando cachaça." Nesse momento, ele lembra dos tempos em que vendia batatas, de quando montou sua primeira empresa de produção de suco de laranja, da primeira exportação, da fazenda comprada para implantar uma usina de cana de açúcar… E pensa no quanto tudo valeu a pena. No fim do dia, ao lado dos amigos, da mulher, dos filhos e dos netos, diz, satisfeito, para si mesmo: "São nessas horas que eu sou mais feliz."
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Como é a produção em Minas Gerais (números da safra 2023/2024)

  • Área plantada: 930 mil hectares

  • Safra: 80 milhões de toneladas (17,3% superior aos 68 milhões da safra anterior)

  • Etanol: 3,28 bilhões de litros (14% superior à safra anterior)

  • Açúcar: 5,4 milhões de toneladas (18,5% superior à safra anterior)

  • Açúcar exportado: 4,40 milhões de toneladas (20% superior à safra anterior)

  • Empregos diretos e indiretos: 160 mil
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