
A comparação se faz pertinente diante de um marco que emerge no bojo deste 2025: os 100 anos de criação desta que responde pela primeira fábrica de bombons, balas e chocolates artesanais de Belo Horizonte. Foi em 1925 que o imigrante polonês Henryk Grochowski fundou a fábrica Lalka – ali, no bairro Floresta. Realizava, assim, um sonho que acalentava desde o momento em que afivelou as malas para embarcar em um navio, junto ao pai, com destino ao Brasil, em 1912.
Há um século o negócio vem passando de pai para filho. Henryk, o fundador, morreu cedo, em 1952. Para não deixar o negócio fenecer, Stanislau Grochowski, seu filho, não hesitou em assumir prontamente o comando. Hoje, a Lalka continua a ser um negócio familiar, tendo, à frente, Roberto Grochowski, 67 anos, filho de Stanislau, bem como seu filho, também chamado Roberto, e os sobrinhos Henryk e Bruno. Atualmente, a fábrica produz, por mês, três toneladas de balas e duas toneladas de bombons e chocolates. Para 2025, há perspectivas de 15% de aumento no faturamento em relação a 2024. Roberto cita o objetivo da empresa de expandir as vendas internas, bem como o incremento nas exportações, abarcando, inclusive, o mercado europeu.

Vale frisar, porém, que, no caso das vendas para fora de Minas Gerais, ela se limita às balas. É que, desde os seus primórdios, o chocolate Lalka não leva conservantes em sua receita (é feito a partir de apenas quatro ingredientes), portanto, exigiria condições muito particulares de acondicionamento e transporte, como aponta Roberto. "Já a bala, fechada, aguenta bem, é bem diferenciada", diz ele.
O produto também já é comercializado no exterior, onde o sabor azedinho (que se mantém até o final) conquistou paladares. Em 2021, a empresa iniciou seu processo de exportação das balas mais vendidas e tradicionais, sabores maçã e beijinho (red apple e litlle kisses), para os Estados Unidos e Canadá. E segue com o projeto de ampliação, com o objetivo de chegar à Europa. "O investimento nos planos de expansão em 2025 será 12% maior que o ano anterior", informa Roberto, que não revela mais. "Esses projetos em andamento não podem ainda ser divulgados, pois estamos na fase de elaboração das estratégias", ressalta.
Sobre os produtos que mais têm saída, além das balas, ele cita o licorzinho, a casquinha de laranja, o bombom de cereja e o pé de moleque, que leva amendoim e chocolate, bem como a língua de gato. "A linha diet também faz muito sucesso, pois os produtos efetivamente têm o mesmo sabor que os da linha tradicional", afiança. As guloseimas são oferecidas a granel, sendo que o cliente pode montar caixas personalizadas (ou, ainda, optar por arranjos em canecas e afins). Um outro chamariz são as embalagens que trazem, impressas, imagens de pontos icônicos da capital mineira, como a Igrejinha da Pampulha, reforçando a ligação com a cidade.
Em termos de datas,o empresário informa que, já há alguns anos, o Natal responde pelo ápice das vendas, pelo fato de mobilizar o consumidor por um período mais estendido, em torno de um mês. Outras efemérides que impactam nas vendas são a Páscoa e, claro, o Dia dos Namorados, Dia das Mães, Dia dos Pais e Dia das Crianças.

No futuro, um sonho romântico de Roberto Grochowski é criar um esquema de visitação da fábrica para crianças. "Desde mais novo, sonho em encher um ônibus de crianças para conhecer a fábrica, em uma experiência da qual elas sairiam com uma espécie de kit", conta. Ele mesmo, quando criança, visitou fábricas como as da Itambé ou da Coca-Cola. "É uma coisa que fica na memória", sustenta, fazendo, espontaneamente, nova alusão à obra de Proust.
Fãs de carteirinha
Não é difícil encontrar, na cidade, pessoas que se assumem fãs inveteradas e dispostas a compartilhar histórias que entrelaçam afeto, memória e perpassam gerações de famílias da capital. Caso da jornalista aposentada Ofélia Lúcia Pedrosa Bhering, cujas lembranças remontam aos anos 1970. "De 1967 a 1973, fiz o ginasial e magistério (que nem existem mais) no Colégio São José, vizinho à Lalka ‘mãe’. À época, eu morava no bairro São Paulo. Não existia ainda a avenida Cristiano Machado, então, gastava cerca de uma hora e 10 minutos para chegar à escola, pela manhã. E andava uns 15, 20 metros da descida do ônibus à escola, trajeto que repetia na volta para casa. Não é exagero dizer, pois, que as balas e chocolates da Lalka adoçavam essa rotina."
Ofélia lembra que, como o dinheiro era curto, muitas vezes deixava de merendar para comprar a bala de maçã, o licorzinho e o tabletinho de chocolate ao leite. "Meus filhos conheceram a Lalka por causa desse meu afeto. Certamente, Nuno, meu neto, conhecerá também", conta ela, que faz dos doces também uma prova de afeto. "Bernardo, um sobrinho muito querido, mora na cidade do Porto, em Portugal, e, sempre que vem ao Brasil, a primeira coisa que faço é comprar a bala de maçã para esperá-lo. É o meu jeito de dizer o quanto o amo", compartilha.
Empreendedor e diretor de empresas, Carlos Leoni, 44 anos, entende que, no curso do tempo, a fábrica se tornou muito mais do que uma simples doceria, mas um pedaço vivo da história de Belo Horizonte. "É um ponto de afeto e tradição que atravessa gerações", afirma ele, que, paulistano, diz ter sido calorosamente acolhido pela cidade. Hoje, pontua, a tradição dos doces ("até mesmo aquele pequeno alívio para dias difíceis") também marca a vida dos filhos. "Minhas pequenas preciosidades que nasceram aqui. E, se Deus quiser, por muitos anos desfrutarão dessas relíquias adocicadas."
A pedagoga Patrícia Azevedo, 59 anos, se recorda dos tempos de infância, quando os pais e avós a levavam à loja do bairro Floresta "para escolher chocolates nas vitrines apetitosas". À época, a preferência da menina recaía sobre os que tinham formatos de bichinhos. Já a mãe aproveitava para comprar por lá o chocolate granulado usado em casa no preparo de doces. Mais tarde, por uma dessas tramas do destino, ela começou a namorar Pedro, primo de Roberto, filho do fundador. "A Lalka Savassi era o nosso ponto de encontro", rememora. Hoje, o apreço à marca alcança a quinta geração da família. "Começou com meus avós, seguiu com meus pais, a minha geração, a dos meus filhos e, agora, segue com a minha neta, Marina, de 3 anos."
História
Em 1912, o primeiro destino de Henryk Grochowski no Brasil foi o Rio de Janeiro. Aliás, registre-se que foi na cidade serrana de Petrópolis, onde foi trabalhar em uma confeitaria, que fez os primeiros cursos no país visando se aperfeiçoar em um universo – o dos doces – que já há tempos o atraía. Na verdade, em sua bagagem, ele já tratou de incluir algumas receitas com o firme propósito de colocá-las em prática por aqui, assim que possível.
Uma curiosidade: nesse período inicial de chegada ao país, Henryk fez amizade com ninguém menos que aquele que, mais tarde, se tornaria o fundador da icônica fábrica de chocolates Garoto – o alemão Heinrich Mayerfreund. A sintonia entre os dois foi tanta que o nome inicialmente pensado para batizar o negócio de Henryk foi "Garota", resvalando a cumplicidade estabelecida. No entanto, o polonês acabou optando por Lalka, que significa "boneca" em sua língua pátria. Nessa altura, Henryk já morava em Belo Horizonte, e a fábrica, como já assinalado, tinha o bairro Floresta como ponto de localização.
Um brinde

Não bastasse, Lobo conta que a proposta do Montê se alinha à da Lalka no sentido de buscar experiências gastronômicas que unam memória afetiva e criatividade. "Essa colaboração é uma forma de ampliar esse conceito, e com um drinque que dialoga com o nosso menu". A bebida foi criada pelo mixologista Lucas Mendes e traz, em sua composição, vodca, aperol, xarope de bala Lalka, limão-siciliano, albumina e maçã desidratada.