O acréscimo de flúor à água tratada no Brasil (regida pela Lei 6.050, de 1974) é uma das medidas de saúde pública mais eficientes, principalmente no que se refere à cárie. Isso já foi comprovado por inúmeros estudos. No país, em municípios onde a resolução é, de fato, vigente, os casos desse tipo de infecção nos dentes diminuíram em quase 60%. Nos Estados Unidos, a providência é considerada um dos 10 maiores avanços em saúde pública do século XX, segundo a professora Simone Rennó Junqueira, da Faculdade de Odontologia da USP.
No entanto, o Projeto de Lei 6359, de 2013, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, propõem o fim da regra, ou seja, que se deixe de acrescentar flúor à água utilizada nas residências. De acordo com a professora, há ainda uma disseminação de informações deturpadas nas mídias sociais sobre o consumo do elemento químico. Em geral, essas notícias são relacionadas à ingestão em grande quantidade de flúor e a possibilidade de ocasionar fluorose (doença que causa fragilidade das estruturas dentárias e dos ossos).
Mas, especialistas da USP ressaltam que o uso tópico do flúor, presente nas pastas de dente, nem sempre é acessível. E, normalmente, quem fica desatendido são aqueles que moram em locais distantes, que não podem arcar com o custo do produto e são desatendidos de saneamento. A professora Simone Rennó Junqueira lembra que o uso da substância química deve ser constante, com o objetivo de ser efetiva, logo, comunidades desprivilegiadas são as que mais sofrem com a epidemia de cárie, uma vez que não têm condições de realizar tratamentos particulares.
Para Celso Zillbovicius, a defesa da fluoretação já tem história. É um debate de 73 anos sempre defendido como um procedimento preventivo da cárie. A pesquisa na área começou, nos Estados Unidos, numa comunidade na qual havia uma alta prevalência de fluorose. Notou-se, entretanto, que o índice de dentes cariados era abaixo do normal. Desde então, quando bem administrado, o flúor tornou-se um elemento essencial à saúde bucal.
Sobre o projeto de lei contra a fluoretação da água, Zillbovicius diz que há setores que não têm interesse nesse benefício para a população. "Claro, não dá para acusar uma ou outra esfera, seria infantilidade, ou imprudência. A questão mais importante não é o porquê do projeto lei. O crucial é, do ponto de vista científico, contra-argumentar o porquê dele não fazer sentido", diz o especialista da USP.
Os professores ressaltam que a medida de saúbe pública é a mais democrática, pois o cidadão não necessita sair de casa para receber a prevenção. "A intervenção odontológica deve ser multifatorial, na verdade, porém, contar com a fluoretação como medida de estado é um grande facilitador. Na região norte do Brasil, o índice de cáries e obturações é cerca de duas vezes maior do que no sul. Investigações apontam que isso é uma das consequências da política de saúde pública já nas águas, dado que, mesmo grandes capitais, como São Luís, no Maranhão, e Recife, em Pernambuco, não aderem ao procedimento", comenta Simone Rennó Junqueira.
Sobre a fluorose, condição proveniente da ingestão de altas doses de flúor, e que se tornou arma daqueles que são contra a política da fluoretação, o professor Celso Zillbovicius esclarece que "existem rigorosas aferições da dosagem do elemento químico, que tem um limite inferior, tal como superior, já que grandes quantidades podem ser danosas". "Embora os parâmetros da distribuidora possam ser duvidosos, existe, como segurança, o heterocontrole, no qual são feitos testes por instituições isentas, de modo a garantir confiabilidade ao padrão da água. O teste funciona também para outros fatores, como cloro e coliformes, fecais e totais", completa o dentista.
(com Jornal da USP)