A Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC, na sigla em inglês), desde 1994, reconhece o papel da bactéria Helicobacter pylori no risco de surgimento de câncer do estômago. Agora, um trabalho conduzido pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) em parceria com a Universidade College de Dublin, na Irlanda, analisou a participação de bactérias da microbiota intestinal na maior chance de aparecimento de câncer de intestino.
Existem mais de 1014 micro-organismos que colonizam o trato intestinal e atuam na regulação de diversas atividades biológicas, como homeostase e funções metabólicas e do sistema imunológico. Nos últimos anos a bactéria Fusobacterium nucleatum tem sido apontada como um fator de risco para o câncer colorretal. É uma bactéria encontrada principalmente na cavidade oral, podendo provocar doença periodontal e gengivites. Contudo, ela também pode colonizar o intestino e quando se reproduz em excesso, pode causar doença intestinal inflamatória, adenoma e câncer colorretal – o terceiro tipo de tumor mais frequente no mundo. No Brasil, ele ocupa o terceiro lugar entre os homens e o segundo entre as mulheres, segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Na maioria dos casos, o câncer colorretal apresenta um bom prognóstico e pode ser tratado se diagnosticado em estágios iniciais. Portanto, é importante conhecer os fatores de risco e mecanismos moleculares envolvidos na progressão deste tipo de tumor para que se possa propor estratégias de prevenção, detecção de grupos de risco e exame precoce, aspectos cruciais para diminuir a mortalidade em países menos desenvolvidos.
O trabalho liderado pela Unesp investigou pela primeira vez na população brasileira o papel da Fusobacterium nucleatum nas lesões intestinais, quantificando a abundância da bactéria em amostras de tecido de adenoma (tumor benigno da mucosa) e câncer colorretal. Também foram avaliadas se a quantidade do micro-organismo poderia estar relacionada a genes e reguladores de vias inflamatórias que podem levar à iniciação e progressão do câncer.
O estudo avaliou 27 amostras de adenoma colorretal, 43 amostras de câncer colorretal e os tecidos normais adjacentes. Segundo matéria divulgada pela Unesp, os resultados mostram que 77% das amostras de cancro e 52% de adenoma eram positivas para a presença da bactéria, o que foi avaliado pela presença do DNA bacteriano. Também foi observada uma maior abundância do DNA bacteriano nas amostras dos pacientes com câncer (8,7 vezes a mais) e adenoma (5,6 vezes a mais) em relação ao tecido intestinal normal.
Como aponta a pesquisa, existem estudos que indicam que testes de DNA em fezes para detecção da Fusobacterium nucleatum podem ser úteis tanto para detecção de indivíduos com tumor, como para prevenção de pessoas com maior predisposição ao desenvolvimento deste câncer.
O mecanismo pelo qual essa bactéria contribui funcionalmente para o desenvolvimento do câncer ainda permanece incerto, segundo os pesquisadores. Os resultados apontam que a bactéria provoca um microambiente inflamatório mais favorável ao desenvolvimento do câncer colorretal em comparação com outros micro-organismos que vivem no local do cancro. Para os cientistas, citados pelo portal da Unesp, provavelmente a bactéria estimula a produção de fatores de crescimento das células intestinais por meio de proteínas externas da sua parede (fator de virulência) que se ligam a fatores específicos da célula do hospedeiro, iniciando, assim, uma resposta inflamatória, alterando o sistema imunológico do "hospedeiro', ativando os genes ligados ao câncer e suprimindo o sistema de reparo do DNA.
(com portal da Unesp)
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